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A ciência é melhor que a pseudociência

O mundo assombrado pelos demônios, Carl Sagan, 1995, Companhia das Letras, 5a edição, 1996, pag 44
 
Nem todo ramo da ciência pode prever o futuro - a paleontologia não tem essa capacidade -, mas muitos o conseguem, e com uma exatidão espantosa. Se você quiser saber quando será o próximo eclipse do Sol, pode procurar mágicos ou místicos, mas terá melhor sorte com cientistas. Eles lhe dirão onde se posicionar na Terra, quando deverá estar nesse lugar, e se vai ser um eclipse parcial, total ou anular. Eles conseguem prever rotineiramente um eclipse solar, com exatidão de minutos, um milênio antes.

Você pode ir ao feiticeiro-curandeiro para que ele desfaça o feitiço que causa a sua anemia perniciosa, ou tomar vitamina B12. Se quiser salvar o seu filho de poliomielite, pode rezar ou vacinar. Se está interessado em saber o sexo da criança antes do nascimento, pode consultar todas as oscilações do chumbo na linha de prumo (esquerda/direita, um menimo; para frente/para trás, uma menina - ou talvez seja o contrário), mas elas aceitarão, em média, apenas uma em duas vezes. Se quiser uma precisão real (neste caso, 99%), tente amniocentese e ultra-som. Tente a ciência.

Pense em quantas religiões tentam se validar com profecias. Pense em quantas pessoas se baseiam nessas profecias, por mais vagas e irrealizadas que sejam, para fundamentar ou sustentar suas crenças. No entanto, já houve alguma religião com a profética e a confiabilidade da Ciência? Não existe nenhuma religião no planeta que não deseje ter uma capacidade comparável – precisa e repetidamente demonstrada diante de céticos convictos – de prever acontecimentos futuros. Nenhuma outra instituição humana chega perto de seu desempenho.

Serão essas declarações um culto no altar da Ciência? Estarei substituindo uma fé por outra, igualmente arbitrária?A meu ver, de forma alguma. O sucesso da Ciência, diretamente observado, é a razão porque defendo o seu emprego. Se outra coisa funcionasse melhor, eu a defenderia.

A Ciência evita a crítica filosófica? Ela se define como tendo o monopólio da verdade? Pense de novo naquele eclipse que acontecerá daqui a mil anos. Compare todas as doutrinas de que se lembrar, observe as previsões que oferecem sobre o futuro, verifique quais delas são vagas, quais são precisas, e que doutrinas – todas sujeitas à falibilidade humana – têm dentro de si mecanismos de correção de erros. Leve em consideração o fato de que ninguém é perfeito. E então simplesmente adote aquela que, numa comparação justa, funciona (em oposição a parece) melhor.

Se doutrinas diferentes são superiores em campos bem distintos e independentes, temos certamente a liberdade de escolher várias – isto é, se não contradisserem umas às outras. Longe de ser idolatria, esse é o meio pelo qual podemos distinguir os falsos ídolos da realidade.

Qual é o segredo do sucesso da Ciência? Em parte, é esse mecanismo embutido de correção de erros. Não existem questões proibidas na Ciência, assuntos delicados demais para ser examinados, verdades sagradas. Essa abertura a novas idéias, combinada com o mais rigoroso exame cético de todas as idéias, separa a joio do trigo. Não importa o quanto você é inteligente ou amado, tem de provar a sua tese em face de uma crítica determinada e especializada. A diversidade e o debate são valorizados. É estimulada a discussão de idéias – substantivamente e em profundidade.
 

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